terça-feira, 17 de junho de 2008

O Lugar da Lógica

O lugar da lógica
“O objetivo da lógica não é determinar se as conclusões são verdadeiras ou falsas, mas determinar se o que se afirma como conclusões são conclusões” (Augustus de Morgan)

“A linguagem mascara o pensamento” (Wittgestein)

Etimologicamente, a palavra lógica vem do grego logos, que significa “palavra”, “expressão”, “conceito”, “discurso”, “razão”. Em termos gerais podemos defini-la como o estudo dos métodos e princípios da argumentação. Ou, então, como a investigação das condições em que a conclusão de um argumento se segue de suas premissas. Entretanto, ao longo de sua história, a lógica teve alguns aspectos revistos, de modo a aumentar sua consistência ou de torná-la mais adequada quanto a sua forma.
Na longa tradição herdada desde Aristóteles, muitos dos problemas enfrentados pelos lógicos decorrem de que as línguas se prestam a ambigüidades, equívocos, falta de clareza, além de deixarem prevalecer conotações emocionais que perturbam o raciocínio. Daí a importância da criação de uma lógica simbólica em uma linguagem artificial.
A lógica simbólica ou matemática, que é a lógica da atualidade, não difere da clássica em essência, mas distingui-se dela de maneira notável, na medida em que, ao desenvolver uma linguagem técnica específica, introduz maior rigor, tornando-se um instrumento mais eficaz para a análise e dedução formal.
O que pretendo neste pequeno ensaio é fornecer um panorama sobre os três modos diferentes de conceber a lógica, enfatizando o último, ou seja, a concepção lingüística, a “logística”, pois por uma questão cronológica é importante ter essa visão, para depois situar “o lugar da lógica”.
A história é uma construção humana e sendo a lógica algo diretamente ligado ao homem e ao seu próprio pensamento, ela também possuí uma história. Sob um olhar histórico, a lógica possuí três períodos: o primeiro abrange a lógica antiga (de Aristóteles até a Idade Média), o segundo inicia-se na Idade Moderna (tendo como expressões notáveis Hegel e Kant) e o terceiro período, atual, inicia-se com Frege (sendo caracterizado como lógica “matemática”, “simbólica” ou somente como “logística”).
No primeiro período, a primeira teoria da inferência formal válida foi desenvolvida por Aristóteles e, mesmo ele não possuindo nenhum conceito unitário de lógica, a lógica tradicional se orientou pelos seus escritos lógicos (reunidos sob o nome “Organon”), dos quais a tríade “conceito-juízo-inferência” baseou-se . Aristóteles fundamenta, junto à metafísica, seu conceito de lógica. A metafísica, de uma certa forma, relaciona-se com a lógica pela busca do dos princípios do “ser enquanto ser” (leis do ser ou da realidade), dando à lógica um caráter ontológico, envolvendo-a, assim, nos problemas colocados por essa ciência investigativa.
O segundo período caracteriza-se pela predominância de problemas ligados à teoria do conhecimento e à psicologia, deixando o esclarecimento de conceitos lógicos básicos para segundo plano. Por um lado um período considerado improdutivo sob um ponto de vista da lógica e por outro, um período que influenciou fortemente os sistemas filosóficos. A “Lógica de Port-Royal” foi um marco desse período, assim como Kant, afirmando que a lógica é uma ciência pronta e acabada (afirmação que posteriormente será concebida como fraca). Entretando, Kant contribuiu de maneira valiosa para o conceito de lógica. A lógica, para ele, seria “a arte geral da razão”, fundamento para todas as outras ciências, um instrumento para avaliação e retificação de nosso conhecimento, contendo somente leis a priori, tendo como objetivo a própria razão e se preocupando com as leis universais e necessárias do pensamento geral. Esse período baseou-se na mente humana como “fonte” da lógica e, por isso, mesmo que Kant afirme que ela não se pauta por princípios empíricos, temos aqui uma concepção psicologista de lógica.
O terceiro período representa a separação dos problemas lógicos dos psicológicos, com a lógica sendo caracterizada como "simbólica" e iniciada pela obra "Ideografia (Begriffschrift)" de Frege, onde refere-se a um sistema simbólico artificial, elementar, não determinado e dotado (pelo menos potencialmente) de uma descrição rigorosa. A atual fase da lógica caracteriza-se pela concepção lingüística e é vinculada à fundamentação da verdade.
Willard Van Quine foi um lógico da filosofia e filósofo da lógica que perpassou por esse período, tomando a problemática da linguagem na lógica simbólica. Para ele, a verdade lógica baseia-se em dois fatos: a gramática, que tem um aspecto puramente lingüístico, e a verdade, que não o tem. Uma sentença é logicamente verdadeira se todas as sentenças munidas dessa estrutura gramatical são verdadeiras. A verdade implica puramente na estrutura gramatical.
Quine traça um limite, separando a lógica e a matemática das ciências naturais, pois estas foram consideradas posteriormente como monopolizando a informação. A lógica e a matemática servem somente como processo de informação e permanecem intocáveis. Aprendemos lógica estudando a linguagem.
No século XIX, terceiro período, surgiram inúmeras lógicas que não só completavam como rivalizavam com a tradicional (a do primeiro período). É importante destacar o lugar da lógica, bem como sua importância, que tem aumentado com o desenvolvimento da ciência e da tecnologia, na medida em que seu campo de atuação se amplia como instrumento do pensar indispensável em filosofia, matemática, computação, direito, lingüística, ciências da natureza e tecnologia em geral (com destaque para setores como: inteligência artificial, robótica, engenharia de produção, administração, controle de tráfego, programação flexível etc.).
A lógica é um instrumento que, desde Aristóteles, evoluí com o tempo, ampliando seu campo de aplicação, no campo da práxis. Essa ciência normativa do pensamento humano não nascera pronta da poderosa mente do Estagirita.

Bibliografia:
Maria Lúcia de Arruda Aranha, Maria Helena Pires Martins. “Instrumentos do pensar (capítulo 9)”, in Filosofando: introdução à filosofia - 3.ed. revista (São Paulo: Moderna, 2003): 100-117.

TUGENDHAT, Ernst. “O que significa lógica?”, in Ernst Tugendhat & Ursula Wolf, Propedêutica Lógico-Semântica. (Petrópolis, RJ: Vozes, 1996): 9-16.
KANT, Immanuel. “I-O conceito da lógica”, in Lógica (Trad. Guido Antônio de Almeida. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1993): 29-33.

QUINE, Willard Van. “O fundamento da verdade lógica”, in Filosofia da Lógica (Trad. Therezinha Alvim Cannabrava. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1972):128-137.

FREGE, Gottlob. “Introdução (Prof. Paulo Alcoforado)”, in Lógica e Filosofia da Linguagem (Trad. Prof. Paulo Alcoforado. São Paulo: Editora Cultrix, 1978): 15.

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