quinta-feira, 8 de julho de 2010

Filosofia e Cinema: "V de vingança"


Temática: Cinema, filosofia e questões existenciais

A temática escolhida para abordar o seguinte filme é difícil de definir e isolar, visto que ambos – temática e filme – são ricos e tratam de inúmeras questões que podem ser tratadas sob diversos ângulos. Optamos relacionar o filme “V de vingança” com as questões existenciais, por achar que elas são o ponto de partida que darão suporte ao caráter ético e político que o filme também possui e que também gostaríamos de destacar.

De modo geral, o que nos chamou a atenção no filme foi sua capacidade de tematizar a tomada de consciência da sociedade, encarnada de maneira exemplar pela personagem Evey. Entretanto, antes de pensar nos desdobramentos de tal retomada, vimos como essencial o encontro com o eu autônomo que antes era desconhecido de tal personagem. O grande heroi do filme – que foge aos padrões comuns, pois possui traços de um terrorista – é um mascarado que, antes de um rosto, possui por debaixo de sua máscara ideias que o motivam a viver. Tal homem, que vive em um universo poético, musical e revolucionário, transformará a maneira pela qual Evey compreenderá a realidade e, de fato, sua existência.

V de Vingança

(Título original: V for Vendetta – Direção: James McTeigue – Roteiro: Andy Wachowski, Larry Wachowski – Produção: Joel Silver – Estados Unidos/Alemanha – 2006 – cor – 132min)

A história do filme remete ao dia 5 de novembro, no qual Guy Fawkes pretendia – em 1605 – explodir o parlamento inglês, sendo um dos eixos de um movimento que estava insatisfeito com a repressão protestante. O soldado inglês católico era o responsável pelos barris de pólvora nesse dia que ficou conhecido como a “Conspiração da Pólvora”. Guy Fawkes, porém teve seu plano descoberto, sendo preso, interrogado, torturado e assassinado. Até hoje, na Inglaterra, comemora-se a captura de Guy Fawkes, no dia 5 de novembro, no que ficou a “Noite das Fogueiras”. Nesse dia, bonecos representando Fawkes são atirados ao fogo, assim como fogos de artifício – para celebrar o plano que não se concretizou.

O homem misterioso conhecido pelo codinome “V”, tem como objetivo vingar esse dia. O cenário, uma Inglaterra do futuro – sob o regime de um governo totalitário –, é a encarnação do próprio conformismo nascido do medo. Sob o comando de Adam Sutler (que em muito se parece com Adolf Hitler) e de seu partido – que controlam os meios de comunicação e a vida da sociedade –, o país protagoniza um progresso, tendo como eixo pilar a imposição de dogmas e valores. “V” conhece a jovem Evey, prestes a ser violentada pelos “homens-dedo” por estar na rua após o toque de recolher. A partir daí, Evey se transformará, deixará de ser uma mulher com medo; medo dos outros e de si mesma.

“V”, no dia 5 de novembro no qual conhece Evey, realiza seu primeiro ataque ao governo de Sutler. Sempre em tom poético e musical, “V” faz a promessa de que em um ano – ou seja, no próximo dia 5 de novembro – cumprirá o que lhes disseram até hoje: “que o dia 5 de novembro jamais deverá esquecido”.

Evey, por sua vez, descobrirá verdades sobre si mesma – através desse homem sem rosto, feito de ideias. Teremos também, o desenrolar de uma história onde, pouco a pouco, descobriremos do que um governo totalitário é capaz para ascender e se manter no poder. “V”, ao fazer com que enxerguemos tal realidade, despertará muito mais que um desejo de vingança: a luta, a vingança, é – na realidade – a busca por justiça. É a busca por nós mesmos.

Fundamentação teórica:

A questão da existência coloca-se como capital na análise da obra cinematográfica, pois, através do trabalho psicológico-existencial da personagem Evey, teremos a conquista da autonomia de pensamento e, consequentemente, de um giro total na postura existencial. Tal postura nos coloca a seguinte questão: para que buscamos a liberdade? Basta estarmos livres ou temos que empreender algo que a honre?

Evey, até certo momento, é aquela que simboliza os que se escondem atrás dos próprios medos, se conformando com uma vida imposta por seu governo; passivos. Com as lições de seu mascarado mestre – o aparente terrorista “V” –, Evey encontrará aquilo que ela sempre sonhou, mas que – até então – havia sufocado.

O desejo de vingança, aqui, possui um propósito particular: ele pretende fazer justiça onde uma falsa justiça impera. E “V” com sua forma única de ser habilidoso na arte de matar e sutil como um artista, dirá a Evey “verdades através de mentiras”. Tal momento que gostaríamos de elucidar acontece quando a jovem é capturada, supostamente, por agentes do governo de Sutler, passando de foragida à prisioneira política. Na prisão, Evey reflete sobre a vida pela qual vale, realmente, se viver. Sendo torturada para que fornecesse informações sobre “V”, Evey mudou sua postura e, ao mesmo tempo, se emocionou com a história de uma mulher homossexual, que foi torturada e morta em conseqüência dos ideais e do estilo de vida que adotou. Essa pequena autobiografia que Evey teve acesso “magicamente”, na prisão, foi a única fuga que se apresentou naquele momento de fome e coragem. E a coragem de Evey abriu as portas da fria prisão.

Tudo, porém, não passou de uma encenação de “V” – algo revelado de maneira surpreendente. Evey atormenta-se quando imagina que tudo não passou de uma farsa; “V” porém, adverte que em meio a essa grande encenação, dessa “aparente mentira”, Evey sentiu que algo realmente havia mudado nela. “Os artistas dizem verdades através de mentiras”, como relembram nossas personagens em certas passagens do filme. E foi por esse o movimento que Evey passou e pelo qual conquistou seu verdadeiro eu. Através de uma “ficção” ela encontrou a verdade; verdade essa que foi encontrada por ela mesma, em seu sofrimento, mas na coragem que daí nasceu e que extrapolou os limites do medo.

Seu mentor, e ao final sua grande paixão, lhe deu condições de encontrar uma verdade sobre si mesma; e a partir daí, Evey poderá mudar o mundo. Ao mesmo tempo que Evey, pela ação e imagem verticalizante de “V”, a sociedade começa a agir, a subir – ela começa a mudar. Como dirá a nossa heroína: “todos temos algo ‘desse homem mascarado’ em nós”. O alerta que o filme também levanta é o fato de que a liberdade não pode ser isolada: ela tem que ser conjunta e consciente. Não bastando, por exemplo, que os símbolos do poder (por exemplo, o Parlamento) sejam destruídos sem que as pessoas estejam conscientes de sua real importância.

Conclusão:

O filme levanta questões que extrapolam um único tema. Gostaríamos de concluir com uma observação que, a nosso ver, perpassa todo o filme e que se impõe como capital em uma condução de reflexões acerca do mesmo.

Nos incitar a cuidar do outro, a abrir os olhos do outro, a retirar o outro da caverna, a revolucionar são, aqui, pontos que se cruzam e se mostram como os objetivos da obra como um todo. Entretanto, antes de estarem conscientes dos fatos exteriores, é preciso que as mesmas se esclareçam, se encontrem e façam bom uso da liberdade que os constituem. A nosso ver, é um “cuidado de si” – um voltar-se sobre si mesmo – que é o ponto de partida para que possamos cuidar dos outros e mudar o mundo. Aqui, o que vale é a identificação entre discurso-ação-vida, onde viveríamos realmente “o que pensa o nosso pensamento”. Não importa, então, se vivemos em uma ficção ou não, mas sim a postura que adotamos em relação a ela.

Por isso, o verdadeiro rosto de “V”, apesar de nos despertar curiosidade, é o que menos importa. Como ele mesmo diz, “sob sua máscara há mais que um rosto: há ideias. E ideias são à prova de balas”. Por isso “V” é invencível até o momento de seu grande espetáculo – a destruição do Parlamento Inglês, a vingança de Guy Fawkes e o reerguimento do símbolo da esperança. “V” foi um homem que – sob sua máscara –, seguiu seus ideais, viveu seu pensamento e sua revolução. E mudou o mundo.

Bibliografia:

*Pesquisa histórica: http://pt.wikipedia.org/wiki/Guy_Fawkes (acesso em 7/07/10)

Elaboração para o ensino médio:

Gostaríamos, no presente trabalho, de traçar um eixo de comparação entre duas personagens, uma do mundo cinematográfico e outra da história da filosofia: “V” (“V” de vingança) e Sócrates. Ambas as personagens possuem uma relação com a verdade e, em conseqüência dessa postura, são conduzidos à morte e possuem uma visão muito comum, uma vez que não a temem. Entretanto, temos também diferenças sutis, pela própria maneira com que se relacionaram com o regime que os governaram, uma vez que “V” era um justiceiro que buscava destruir o regime de seu país e Sócrates, um homem – que incomodava muitos cidadãos – e que buscava abrir os olhos daqueles que acreditavam saber tudo, mas que – no entanto – confiava na justiça de sua polis, permitindo ser condenado, mesmo que seguindo seus ideais até o fim, na prisão. Ambos morreram, no entanto, como símbolos – um como o símbolo da “vingança justiceira” e o outro como o símbolo do filósofo, aqui, como aquele que busca a verdade até o fim de sua vida.

A partir da análise da obra cinematográfica e do texto elaborado a partir da introdução da obra “A hermenêutica do sujeito”, de Michel Foucault, acerca da figura de Sócrates, buscamos trazer a tona uma reflexão acerca da “Parrhesia”, entendida como “o dizer verdadeiro”, no qual o falante se compromete com aquilo que ele diz, ou seja, na identificação entre sujeito e discurso onde quem fala vive realmente aquilo que disse. Constitui-se, então, um discurso franco que enfrenta todos os perigos, mas que não se contradiz e não se deixa mascarar pelo medo.

Sócrates

Foucault remete sua hipótese, de que o preceito délfico gnôthi seautón é uma técnica do cuidado de si, ao diálogo platônico "Apologia de Sócrates". Pela questão do tipo de vida levada pelo filósofo e a compatibilidade do discurso do mesmo, caracteriza- se um ponto fundamental analisado por Foucault: a parrhesia, ou seja, o dizer verdadeiro, onde a relação filosófica sujeito/verdade dependia da compatibilidade do discurso e do pensamento com a atitude.

Segundo Foucault, "com a noção de epiméleia heautoû, temos todo um corpus definindo uma maneira de ser, uma atitude, formas de reflexão, práticas que constituem uma espécie de fenômeno extremamente importante (...)". Para um filósofo greco-romano, o cuidado de si abriria inúmeras possibilidades de modos de vida e de acesso à verdade. O filósofo quer ter uma vida diferente, clama pela ética e pela auto-transformação, onde o "si" desempenhará um papel fundamental. A busca da verdade exige um certo modo de vida do sujeito que diz a verdade, além das práticas que permitem essa auto-transformação. A verdade estaria nessa relação.

Em Sócrates, e este filósofo é chamado como "o homem do cuidado", o gnôthi seautónaparece atrelado à epiméleia heautoû ou até mesmo subordinado: o filósofo tinha como ofício incitar os outros a se ocuparem consigo mesmos, a terem cuidados consigo e não descurarem de si. Sócrates, ao ser acusado, não mudou seu discurso, continuou afirmando que não deixaria de filosofar. Levanta para nós o problema da atitude: falar de acordo com o viver e viver de acordo com o que é falado. É essa a conjuntura que constituiria a parrhesia: uma relação entre o falante e aquilo que se diz.

(FOUCAULT, M. A Hermenêutica do sujeito. Tradução de Márcio Alves da Fonseca e Salma Tannus Muchail. São Paulo: Martins Fontes, 2004.)

“V”, desse modo, também é um parresiasta, que clama por vingança e libertação.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

A ANÁLISE DAS FORÇAS


A ANÁLISE DAS FORÇAS

Bruno Latour, para superar a dicotomia entre internalismo e externalismo, adota uma perspectiva de forças, imanente ao trabalho racional e científico, negando as dicotomias clássicas da filosofia da ciência: ciência-política, ciência-sociedade e internalismo-externalismo.

A noção de força em Latour não é a priori, pois somente na prática científica poderemos – esta, por sua vez, sofrendo em rede os efeitos de suas ações – compreender seu real sentido. Sua noção de força está atrelada ao cenário histórico-social no qual a ciência se desenvolve, nos mostrando a impossibilidade de simples dicotomias que se traduzem em pólos distintos. Latour, visando recompor o eixo ciência, natureza e sociedade, adota uma perspectiva de redes de forças que se afetam de maneira mútua, sem um caráter hierárquico.

Tal noção é capital para a constituição do objeto da história das ciências – história essa que é “empírica, filosófica, teórica e agnóstica em termos de ciência”. Segundo Latour, para se fazer uma história das ciências, não precisaríamos situar-nos dentro da lógica científica ou no campo das provas irrefutáveis, mas sim analisar essas redes de tensões que se traduzem em forças, num autêntico modelo de guerra. Analisar a razão filosófica e científica “é mostrar de que maneira as forças lutam entre si”, suas relações constantes e suas mudanças de ângulo.

O micróbio pode ilustrar, em linhas gerais, essa perspectiva de rede. Um micróbio é uma teoria, um discurso, que necessita ser verificado – que oferece uma resistência material. Entretanto, já no nível do discurso, o micróbio exerce sua influência na sociedade, sofrendo a devida resistência (ou seja, sua força contrária, oposta). Essa sociedade, porém, não é “una”, pois temos aqueles que assistem ao desenvolvimento científico e aqueles que investem com capital nas pesquisas. Esse simples exemplo, porém, não se resume a esses aspectos, pois – como encontram-se em rede – os elementos se fazem repercutir e afetar de diversas maneiras, sofrendo suas respectivas transformações daí resultantes. As próprias redes, por sua vez, sofrem suas transformações.

O objeto da história das ciências, porém, é mais que o objeto dessa dinâmica, também não se isolando em pólo algum, mas que não se confunde com o objeto próprio da ciência e da história comum. É, pois, acima de tudo uma construção original.


Bibliografia:

PORTOCARRERO, V. As ciências da vida: de Canguilhem a Foucault. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2009.

Canguilhem e o conceito


CANGUILHEM E O CONCEITO

De acordo com Georges Canguilhem, o conceito é propulsor de questões, desempenhando um papel capital no progresso científico – que, aqui, não é considerado como necessariamente contínuo – assumindo, assim, uma postura anti-positivista. Dessa maneira, Canguilhem visa superar, na história das ciências, duas posturas clássicas: uma postura que privilegia a lógica científica (internalismo) e outra que privilegia as causas externas (externalismo).

A análise do conceito que permeia o desenvolvimento científico é um movimento capital para o historiador das ciências, pois muito antes de ser algo instituído, o conceito é problematização; ele aponta para questões: “o conceito não é uma palavra, mas uma denominação, uma definição, um nome dotado de um sentido capaz de interpretar as observações e as experiências.” Essa análise, que visa os conceitos operatórios – ou seja, aqueles que fazem a ciência funcionar –, vai muito além de uma simples história das teorias. Tal análise busca as condições nas quais um conceito foi formulado, as relações que mantêm com outros conceitos e que tipos de problema ele pretende solucionar. A perspectiva histórica, por sua vez, ganha importância, uma vez que a atividade científica não é atemporal e está inserida num coletivo, a saber, a comunidade científica. Só existe ciência quando existe diálogo entre seus membros.

“Por sua função de operador na produção do conhecimento científico, é o conceito que garante a eficácia teórica ou o valor cognitivo da ciência, encerrando uma norma operatória ou judicativa que não pode variar sem a retificação de sua compreensão”. Essa retificação está atenta as turbulências atravessadas pela ciência, que é marcada pelo regionalismo, pois cada setor da ciência possui uma especificidade instrumental, metódica, temática – fatores esses que excluem toda postura absoluta, generalizante e que nos fazem analisar a questão a partir de “regiões de cientificidade”. Uma epistemologia histórica, calcada na verificação dos conceitos, é um dos objetivos de Canguilhem, pois se apresenta como um caminho onde uma distinção entre a história dos conhecimentos superados e uma história dos conhecimentos sancionados é possível.

A epistemologia é judicativa. Partindo da última linguagem da ciência, ela julga os conhecimentos anteriores – o que constitui, assim, uma atividade dinâmica porque nunca definitiva. Diante dos abandonos axiomáticos e rupturas da atual ciência, a história se renova. O conceito está aí, pois é ele que possibilita esse julgamento.

O grande erro da tomada do internalismo e do externalismo como pólos absolutos está no fato de que nenhuma das duas perspectivas consegue abarcar o problema quando isoladas uma da outra. O internalismo coloca que não é possível fazer uma história das ciências se não nos situarmos dentro da lógica científica, ou seja, se não conhecermos de fato a linguagem científica da atualidade: os problemas só poderiam ser tratados sob uma perspectiva interna, do ponto de vista da própria ciência. Assumimos, assim, uma postura teórica na construção do objeto dessa história.

Já o externalismo condicionaria essa história aos interesses externos como a economia e a política, por exemplo. A história da ciência somente sofreria reflexos da história civil, caráter que tende a deixar de lado a historicidade própria da ciência, uma vez que ela seria encarada como uma espécie de “superestrutura”, num “marxismo empobrecido”. Aqui, a ciência seria um jogo de interesses. Nos esqueceríamos, porém, de um caráter essencial: a pretensão à verdade – mesmo que não absoluta.

Tal barreira imposta pela dicotomia entre internalismo e externalismo constitui uma problemática a ser superada, pois o conceito situa-se entre os dois pólos. A história das ciências não tem uma relação apenas com a lógica científica e suas querelas, mas com os interesses que a circundam e que, por exemplo, interferem no andamento de certa pesquisa. Nesse ponto central, o conceito recebe ambas as influências, fazendo com que o objeto dessa história – que é o discurso acerca de um objeto não dado e inacabado – sempre se renove. Canguilhem, portanto, coloca-se contra uma perspectiva dogmática e cristalizada do saber, colocando a teoria do conhecimento, a epistemologia e a história das ciências como disciplinas sempre abertas ao diálogo e ao novo.


BIBLIOGRAFIA:

CANGUILHEM, G. O objeto da história das ciências. Tempo Brasileiro, 28, 1972.

PORTOCARRERO, V. As ciências da vida: de Canguilhem a Foucault. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2009.

Thomas Kuhn


O PARADIGMA E A ESTRUTURA DA COMUNIDADE

Thomas Kuhn, em seu posfácio, faz uma revisão do termo “paradigma” ao indicar que, ao longo de seu livro, o mesmo é usado em dois sentidos diferentes: 1 -“De um lado, indica toda a constelação de crenças, valores e técnicas, etc..., partilhadas pelos membros de uma comunidade determinada”. Essa primeira definição liga-se fundamentalmente com a estrutura da comunidade, uma vez que uma comunidade - a científica -, a qual estuda um objeto específico, só se reconhece como tal ao compartilhar um paradigma. Antes mesmo de praticar sua especialidade científica, os cientistas que constituem uma mesma comunidade receberam uma iniciação profissional e educacional similares. 2 - “De outro, denota um tipo de elemento dessa constelação: as soluções concretas de quebra-cabeças que, empregadas como modelos ou exemplos, podem substituir regras explícitas como base para a solução dos restantes quebra-cabeças da ciência normal”. Aqui Kuhn identifica “paradigma” como uma constelação dos compromissos do grupo, relacionando-o, assim, com a comunicação e julgamentos profissionais - tendo como componente importante as generalizações simbólicas (que funcionam em partes como leis e em partes como definições de símbolos que elas empregam). Kuhn atenta para o fato de que os paradigmas também podem ser encarados como exemplos partilhados, pois esses dão um grau empírico a uma determinada lei, constituindo um ponto de partida para aplicação na ciência normal. A partilha de exemplares visa a aquisição de um olhar que estabelece similaridades; assim, o cientista aprende a ver situações como semelhantes: “Uma vez percebida a semelhança e apreendida a analogia entre dois ou mais problemas distintos, o estudante pode estabelecer relações entre os símbolos e aplicá-los à natureza segundo maneiras que já tenham demonstrado sua eficácia anteriormente”.



BIBLIOGRAFIA


KUHN, T. A estrutura das revoluções científicas [tradução de Beatriz Vianna Boeira]. 8ª edição. São Paulo: Perspectiva, 2003. (Coleção Debates)